O ESPALHAFATOSO CARRO DO DIABO
Em 2020, publiquei, pela Rinaré Edições, O Espalhafatoso Carro do Diabo, a história de Mané do Bode e seu perrengue diante de um encontro pra lá de tenebroso.
"Nessa tremenda carreira, até vento ele venceu..."
Este trabalho busca transmitir um pouco da essência da cultura nordestina, valorizando a poesia, o riso e a reflexão, em harmonia com a nossa rica tradição!
Peço aqui vossa atenção
Para uma história contar,
Seu enredo é cabuloso
Que nos faz arrepiar,
Do homem que prometeu
Com o Demo viajar!
Próximo de Campo Maior,
No lugar Aracati,
Nas margens da rodovia
Que passa em Piripiri,
Antes de Cocal de Telha,
Estado do Piauí.
O que ouvi daquele povo,
Agora conto a vocês.
Dizem ter corpos que saem
Das tumbas e, quando em vez,
Aparecem transitando
Na BR 3,4,3.
Na construção da BR,
Dentro das valas cavadas,
Várias botijas com ossos
Humanos foram achadas.
Daí a motivação
Daquelas almas penadas.
Bem perto, Mané do Bode,
O marido de Maria,
Morava e se dedicava
À luta do dia a dia
Para tirar o sustento
Do roçado que fazia.
Mané, uma vez por mês,
Tinha que ir à cidade,
Além de fazer as compras,
Havia necessidade
De vender o produzido
Da sua propriedade.
Por isso, num certo dia,
Logo depois do café,
Mané foi para BR
Disposto e com muita fé,
Em conseguir um transporte,
Pois era longe ir a pé.
Seu rumo, Campo Maior
Por ter mais comerciantes.
Saiu de casa apressado,
Tendo a mulher dito antes:
— São Cristóvão lhe proteja!
O Santo dos viajantes.
Era muito perigoso
Viajar em caminhão,
Suas cargas balançavam
Naquela estrada de chão,
Mesmo assim, quando um passava
Mané lhe estendia a mão.
E sempre que algum parava,
Ele depressa dizia:
— Tem vaga aí na boleia?
Mas como resposta ouvia:
— Só tem em cima da carga.
Porém, Mané não queria.
Já depois do meio-dia
Para casa ele voltou:
— O que foi que aconteceu?
Maria lhe perguntou.
E ele disse: — Foi seu Santo!
Pois em nada me ajudou.
Só queria ir na boleia,
Sobre a carga eu tenho medo!
O Santo fez mal-ouvido
E do teu rogo brinquedo.
Agora até com o Cão,
Vou e não faço segredo.
E saiu depois do almoço,
Antes, porém, foi dizendo:
— De qualquer jeito eu irei,
Pois não estou me contendo.
E o Capiroto que faça;
Que o Santo não tá fazendo!
Voltando ao ponto avistou
Uma ingrisia na estrada.
Era um carro de cipó
Com boleia escancarada
E o motorista acenando,
Sugerindo a sua entrada.
Este feioso sujeito,
Como antes nunca visto,
Tinha olhos esbugalhados
E dois chifres de Mefisto,
Denunciando ser mesmo
Encarnação do Anticristo.
Danou-se a fazer munganga,
Parecendo tirar sarro.
Até cambalhotas deu
Com um trejeito bizarro,
Esnobando peripécias
Na direção do tal carro.
Além de ser muito estranho
Aquela improvisação,
As rodas feitas de cera,
Amarradas de cordão,
Só de ver se percebia
Ser mesmo o carro do Cão!
O Tinhoso motorista
Logo tratou de lembrá-lo,
Dizendo: — Me prometeste,
Estou aqui para buscá-lo,
Nesta jornada eu terei
Prazer em acompanhá-lo.
(.).
Além de fumaça e fogo
Que a tal explosão deixou,
Um forte cheiro de enxofre
Naquele instante exalou.
Mané, de tão assombrado,
Para casa disparou.
Quanto mais ele corria,
Mais tinha necessidade.
Um misto de desespero
E brutal ansiedade,
Fez com que desenvolvesse
Tamanha velocidade.
Nessa tremenda carreira
Até vento ele venceu,
Chegou de calça molhada,
Forte fedor recendeu.
Sua mulher perguntou:
— Que diabo lhe aconteceu?
Continua...
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